segunda-feira, 27 de março de 2017

IVONE BARBOSA - Ubireval Alencar










IVONE BARBOSA - ÚLTIMO CANTO DA COTOVIA   -   Ubireval Alencar



"ALÔ, COTOVIA!
AONDE VOASTE?
POR ONDE ANDASTE?
QUE SAUDADES ME DEIXASTE?"
(Manuel Bandeira, poeta).

Ela nasceu cotovia. Tinha na sua genética o canto como alimento e sobrevivência. Bem antes que sua família-coral despontasse, Ivone já prenunciava o canto, e o entoava nas manhas de afazeres domésticos, no casarão comprido do seu Antônio Barbosa/Dona Dalva, lá na rua da Cruz. Lá do Alto, tínhamos a vista de todos os alpendres das casas voltadas para as ribanceiras ainda não habitadas/construídas.

E era nessas manhãs de férias do Colégio que eu aprendi a ouvir as canções ensaiadas pela Ivone. Uma família de afinados cantores (bem depois é que ganhariam notoriedade José Adalto, Ivan, Adeilton, e o cantor reputado nacionalmente Beto Barbosa).

Em meio a tantas canções, sempre com os acordes do tema AMOR, Ivone não omitia sua canção-tema referida: 

"Hoje que a noite está calma
E que minha alma esperava por ti
Apareceste afinal, 
Torturando esse ser que te adora
Volta, fica comigo..."

Era a imagem viva da eterna e sonhadora cotovia nas manhãs suaves e frias de Mata Grande. Os demais irmãos devem ter despertado para a musicalidade a partir desses prenúncios cantantes.

Mas os anos a avançaram, e cada cantor na Família Barbosa foi escolhendo seus espaços e constituindo famílias novas. Ivone se casa com Antônio Gonzaga e concebe três filhos: Yteógenes, Airton, Aline. O coração largo de mãe não se dá por contente. Pertencia a uma verdadeira dinastia, de numerosos e incontáveis irmãos. Graciele e João Paulo são os filhos do coração estendido. Chegou a ver a felicidade dos netos Adriele, Danilo, Yuri e Yasmin.

Como bem acentuou o poeta pernambucano, 
"Aonde voaste... ( e quantas  Saudades (nos) deixaste?"

Ivone compunha a vida no sentimento. Dele se alimentava e, como espasmos frutíferos, servia de condimentos a todos os revezes ou torpezas que a vida infausta lhe desferia. Mas dores continuadas e silêncios amargos do abandono e desprezo lhe tributaram o primeiro infarto. Mais um derrame lhe deixou sequelas irrecuperáveis. O coração e os olhos não deixaram de cantarolar o amor, o perpétuo desejo de uma vida feliz. E assim assobiou suas melodias até seu último canto.

Nesse momento, Ivone já integra o Coral dos Serafins, entoando Hosanas ao Filho de Davi. Viveu na terra a Cotovia de paz, a mulher, mãe e avó extremada. Recebe nas alturas a coroa dos justos e seu galardão. Com certeza harpas e cornetas angelicais a receberam na  eternidade dos grandes amantes da terra. 

Um comentário:

  1. Mas a cotovia até hoje nos faz falta. Cantava sem parar.Uma cigarra anunciando os estios, ora a fartura de frutos da estação.IVONE, qual cigarra ultimando sua temporada de canto, deverá ter ressecado em algum pé de goiabeira ou jasmineiro, silenciando nas manhãs de Mata Grande. Encerrou o ciclo da estação do canto, alimento e anestésico de suas dores do Tempo, partindo a cotovia humana para a estação dos páramos celestiais.

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