quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

INFÂNCIA BUCÓLICA - Helena Alves Mendonça






Quando minha irmã Valderez nasceu, eu caminhava com dificuldade, por isso, meu tio José Villar de Mendonça pediu à minha mãe para eu ir passar uns dias na fazenda de sua propriedade, que ficava localizada no Sítio Buenos Aires, zona rural de Mata Grande, Al.



Lá, o dia começava ao raiar da aurora. Às quatro horas de manhã o reboliço começava dentro de casa. Meu pai adotivo e meu primo já estavam com os empregados no curral, para ordenhar as vacas. Não havia leiteiro. O leite passava do úbere da vaca diretamente para os canecos de alumínio, que tão ansiosamente era por nós aguardado, em cima da cerca de estacas que cercavam o curral.


Depois, tomávamos café com leite, acompanhado de ovos, queijo de manteiga que era fabricado pela minha segunda mãe. Tudo era feito artesanalmente. O café era cultivado lá, colhido, posto para secagem, torrado com rapadura, em seguida pilado no pilão de madeira. O pó do café era colocado numa chaleira de ferra com água fervente e um pedaço de rapadura para adoçar.

Na casa de meus pais biológicos, na cidade, onde fui residir com a idade de 7 anos para estudar, o leiteiro vendia um litro, uma garrafa e meia garrafa de leite às portas das residências.


Em São Paulo, onde residi por dois anos, minha cunhada, de origem espanhola, pediu-me que fosse à padaria comprar um pacote de leite e uma bengala. Confesso que achei aquele pedido muito estranho e fui pelo caminho pensando: que coisa esquisita: Existe leite de pacote? E vendem bengala numa padaria? Fiz o pedido, com hesitação. Para minha surpresa, o vendedor deu-me um pacote de leite e um pão comprido que era a tal bengala.

Morar na cidade foi uma nova experiência para mim, achava tudo muito diferente. Muitas casas junto umas das outras e ficava admirada de ver tantas pessoas reunidas.


Na fazenda, as casas ficavam distantes umas das outras. Não tinha telefone, nem luz elétrica, mas tínhamos lamparinas e candeeiros. Nosso contado era restrito aos membros da família e aos empregados. De oito em oito dias , meu pai ou meu primo  iam à feira das cidades circunvizinhas para comprar os víveres de que necessitávamos.


O período escolar começou. Fui matriculada no Grupo Escolar Demócrito Gracindo de Mata Grande. Como eu não sabia ir a à escola sozinha, meu irmão Germano tornou-se “um guia quase perfeito”: escondia-se nas lojas e deixava-me sozinha na rua. Eu saía caminhando a ermo. Lembro-me de uma vez em que subi uma ladeira que era ladeada por eucaliptos. Fui subindo, subindo, quando já estava próxima aos degraus que davam para a Igreja Matriz de Nossa e Senhora da conceição, ele gritou: “Volte! Não é por aí” e eu voltei. Isso durou várias semanas, porque a cada dia, ele tomava um caminho diferente.




Certa vez, quase fui atropelada por um jumento, que estava perambulando pela rua., Contudo, caso isso acontecesse, não seria um atropelamento tão grave, como o que aconteceu ao leiteiro do CONTO de Carlos Drummond de Andrade, dedicado a Cyro Novaes.



NOTA:

Helena é minha irmã e tem boa memória. Professora aposentada. Fala fluentemente, Português, Inglês, Espanhol e Japonês.

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