terça-feira, 17 de maio de 2016

DONA LUIZINHA - Ubireval Alencar


LUIZA VILAR DE MENDONÇA : 10.10.1910 + 21.04.2000


Desde 1956, aos 12 anos de idade, comecei a ausentar-me de Mata Grande, vida de seminário e estudos, e somente acompanhava na igreja matriz, algumas presenças marcantes.

Entre tantos, o Sr. Balbino, sempre assíduo às missas dominicais, fervoroso, um próspero negociante de víveres, cereais, e que também mantinha uma padaria no mesmo local de comércio, na chamada Rua de Baixo, hoje Ubaldo Malta. Sempre cabisbaixo nos passos, compungido nas orações da igreja, ouvia atentamente as preleções do vigário, Pe. Aloysio Viana Martins.

Havia a ala exclusiva para os homens, à frente, diferenciada da ala feminina das inúmeras devotas, Tia Dona, Tia Marieta, Ana Rosa, e tantas em maior número que o dos homens. Não me lembro da presença do casal, embora em casa a família vivesse um silêncio de separação. O silêncio dos filhos fora de casa complementava o silencio maior, interno, de D. Luizinha. Raramente era vista à soleira da porta, durante a passagem da procissão de N. S.de Conceição, em primeiro de janeiro , e de São Sebastião, no dia 20 do mesmo mês, lá na Rua Nova, hoje  Rua 5 de Julho.

Três lindas garotas - Helena, Valderez e Valdecy - cresciam em graça, beleza, e estudos. Helena em breve ganharia a capital, em busca de maiores estudos, e lá fez carreira toda a vida, onde permanece aposentada;    Valderez e Valdecy cursavam o ginásio em Mata Grande, vindo a inscreverem-se em concurso do Banco do Nordeste. Valderez, hoje aposentada,  mantém o mesmo enclausuramento vivido na infância e Valdecy, também aposentada, vive na Capital do Estado.

Os rapazes, Faustino, Guilherme e Hildebrando, tomaram destinos diferentes, rumando para São Paulo, sempre uma expectativa e ambição de todos os nordestinos em avanços maiores ;  e o mais novo, Germano cursaria estudos em Mata Grande,  logo vindo a enamorar-se da filha muito atraente de D. Hilda e Sr. Otacílio, a bela Icléa. Bancário também do Banco do Nordeste, bem-sucedido na carreira, hoje,  aposentado, bacharel em direito, agropecuarista e colunista social da memória de Mata Grande,  é pai de Geovanna Lea, hoje competente médica exercendo suas atividades em Brasília; Marcus Vinicius , bacharel em direito e também agropecuarista; e Germano Enrico, contabilista; estes exercem suas atividades profissionais em Arapiraca e Santana do Ipanema, respectivamente.

Que segredos guardou toda vida D. Luizinha, deixando filhos tão esmerados na educação, prestimosos na postulação de suas vocações para o trabalho e responsabilidade? Nunca se ouvia qualquer queixa da senhora sempre recolhida, de vida pacata, e que se ausentou das ruas e cultos religiosos na cidade. As moças, belas, sempre esboçavam um sorriso comunicador, e transbordando alegria na boa convivência. Os rapazes, comunicativos e simpáticos, jamais deixaram passar qualquer ranhura na vida em família. A dignidade do lar, os laços de afeição vividos intra-muros sempre foram as colunas que os mantinham e irmanavam. Uma devoção à genitora que com certeza somente lhes incutia palavras engajadoras de conhecimento de vida, apreço ao bem-estar  e à convivência maior entre os demais citadinos.

A casa da Rua Nova tornou-se nas tardes ensolaradas um autêntico monastério. Havia uma reclusão de uma senhora de linda presença, ausente dos festejos natalinos nas ruas da cidade, um distanciamento dos cultos religiosos a que sempre tivera assiduidade, e, em contrapartida, respirava-se o ar e temperatura que exalava daquela família com filhos bem educados e todos se encaminhando nas sendas da vida.

Certas portas nunca se descerram, já dizia o excelente Graciliano Ramos. A leitura do tempo e o passar das gerações hão de ler nas consciências e corações atingidos toda uma razão de ser, e só os que viveram, vivem hão de guardar consigo os matizes e motivos de nossos passos certos ou erradios nessa existência. Importa o bem do ensinamento que ficou impregnado em cada vida, em cada filho, e a bonomia de viver entre os demais. Exemplos de mães que tudo fazem para poupar os filhos de aspectos negativos ou menores jamais fomentariam em suas consciências um futuro assassino, uma filha perdulária, um gestor irresponsável.

Uma mãe zelosa gestava dia a dia, antevendo o futuro dos filhos, a linha de conduta e encaminhamento nos passos das responsabilidades sociais futuras. E se fizeram homens e mulheres de reputação ilibada. O silêncio da genitora os acobertou contra as perversidades da vida mundana; seu enclausuramento de escolha  de mãe foi o longo preparatório da geração que viria ao mundo dar o seu sim de responsabilizações.

As preces do pai religioso os imunizou contra as pestes daninhas da sociedade de drogas e maus feitos. Se não juntos toda vida, num mesmo lar, mas se tornaram os genitores guardiões da célula maior da sociedade - a preservação dos filhos da influência perniciosa de um mundo já em desvario. E ficamos com a imagem do homem devoto, Sr. Balbino,  presente aos ensinamentos eclesiais, e a vida compungida e de recolhimento da senhora Luizinha, guardando-se no anonimato de viver, existir e de ser mãe  protetora. Os céus complementarão a leitura do que a nós não é dado compreender.


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