A
Cultura do Homem ou o Homem da Cultura?
Por Seminarista
Joelder Pinheiro Correia de Oliveira
Já de início, vale ressaltar que
existe uma diferença basilar entre o que é natural do que é cultural. Natural é
tudo aquilo que não sofreu a interferência do ser humano; é o ordenamento que
rege os seres e os encadeiam num organismo cíclico vital, num ciclo tão
sistemático que mesmo as espécies mais exóticas ou horripilantes tornam-se
importantes. Noutras palavras, natural é a manifestação das coisas tal como são,
ou seja, é o cosmo que, como diz a sua etimologia, é ordenado desde sua origem.
Nesta estrutura natural está uma espécie diferenciada, que se destaca por sua
racionalidade e dignidade: o homem.
Poderíamos nos perguntar: o que é o
homem? As explicações que encontraremos serão inúmeras, passando pela
antropologia, filosofia, biologia, sociologia, enfim, cada área o identificará
por sua ótica de pesquisa. O homem é um ser magnânimo, que tendo recebido, como
dom, a racionalidade, assume o papel e a possibilidade de ser criador, inventor
e construtor de sua própria história. Ele não é apenas mais uma criatura entre
tantas, é um ser incrível, cheio de potencialidades. O homem traz em si a
junção de tempo e eternidade, numa relação que o torna capaz de se realizar,
porém, sempre desejoso de possuir algo maior; trocando em miúdos, o homem é um
ser que conhece e luta para alcançar o objeto conhecido, que pode escolher e
sabe que está escolhendo, num caminho ascendente e transcendente. O homem é um
ser tão claro, tão estudado, tão manifesto, e, ao mesmo tempo, tão sombrio, tão
oculto, tão misterioso. Estas relações um tanto paradoxais são interessantes
porque, por mais que se investigue sobre o homem, sempre tem algo a ser
descoberto. O homem é um ser mutável que está em constante construção!
A produção cultural se dá nessa
relação entre o homem e a natureza, isto é, a cultura é ação do homem que cria,
inventa, e, para tanto, ele se utiliza da natureza ou inspira-se nela. Diria
mais, a cultura é um transbordamento do homem, que, inquieto, manifesta suas
alegrias e tristezas na dança, na pintura, no artesanato... Que amando ou
odiando cria versos melódicos, poemas, músicas... Que pensando sistematicamente
ou em devaneios inesperados escreve, projeta, arquiteta, formula... Que sendo
homem, não se contenta em apenas sê-lo, mas quer se perpetuar pelos feitos
heroicos e inéditos.
A cultura é tão veemente que marca a
vida de um povo, de uma região, como uma característica que torna esse povo tão
peculiar, tão singular. É uma marca bela que embeleza a cotidianidade e os
costumes dum povo. Neste sentido, a cultura é do homem, é objeto dele. Quando a
cultura é um transbordamento do homem, gera-se uma harmonia entre a diversidade
cultural. Neste sentido, a diversidade cultural demonstra o quanto o homem é
rico em sua criatividade e em seu modo de ver o mundo que o cerca. Essa
diversidade nunca será conflituosa, por dois motivos: pelo respeito ao próprio
homem e pelo reconhecimento da capacidade criadora de outrem.
Quando, porém, uma cultura se
sobrepõe a outra, o homem, mesmo que não perceba, passa a ser objeto. Nesse
conflito não é levado em conta a pessoa, mas o desenvolvimento de capacidades
de um grupo cultural. Eis porque existe tanto preconceito contra a cultura
nordestina, reduzindo-a a uma imagem deturpada e vazia. Eis porque a cultura
norte-americana ou europeia se impõe como parâmetro determinante dos modos como
as outras culturas, tidas como inferiores, devem se portar. Nessas relações, o
homem não é levado em conta, ele é da cultura, é objeto dela. Em outras
palavras, quando o homem torna-se objeto da cultura, cria-se uma hierarquia
cultural sem sentido, gerando o desrespeito.
É inaceitável tal postura! Será que
é correto aceitar que o baião, a figura do vaqueiro, o chapéu de couro, os
festejos de São João e São Pedro com suas quadrilhas, e outras tantas formas de
manifestação cultural do nordeste sejam tidas como desconsideráveis ou
inferiores? Não! Devemos valorizar nossa cultura, nosso jeito de ser
nordestino, com o sotaque arrastado e outras tantas características, sem querer
importar outras culturas à nossa somente por sem consideradas melhores. A
beleza da cultura está na sua diversidade. Não há necessidade de rótulos de
melhores ou piores, evoluídas ou não, pois toda construção cultural não é o
resultados de competições de produção, mas o resultado da beleza de ser homem,
de poder criar e ser capaz de se expressar de modo todo peculiar.
Portanto, depois de tudo isso, cabe
a pergunta: a cultura é do homem ou o homem é da cultura? Por mais que o homem
sofra influências culturais, a cultura deve ser sempre um objeto do homem, pois
se ele se torna objeto dela, haverá desigualdades, preconceitos e desrespeitos.
Se homem se torna uma coisa, não será levado em consideração e sua dignidade
não será respeitada. Somos convidados a respeitar a diversidade cultural! Quer
seja nordestino ou não, brasileiro ou não, amemos nossa cultura e valorizemos
as demais, construindo a unidade na diversidade e a harmonia na pluralidade.